quinta-feira, 28 de abril de 2011

O Garoto Negro Que Queria Ser Cantor


A televisão e Ana Maria Braga me acordaram. No Mais Você, a loira apresentava uma reportagem sobre algumas crianças de um abrigo, onde eram acolhidas quando retiradas das ruas e do seio de famílias desestruturadas. Uma a uma, aquelas desafortunadas criaturas iam dando seu depoimento acerca da carência afetiva e de seus sonhos em família. Como nossas crianças são maltratadas! Passa de 4 mil a quantidade delas, prontas para a adoção. Porém, as famílias a isso dispostas discriminam suas exigências: A criança precisa ser, impreterivelmente, de até 3 anos, do sexo feminino e branca. O menino, adolescente, negro, que queria uma família, explicava seu desejo de ter pai e mãe que lhe ajudassem a ser cantor. Enquanto a conversa com o repórter se desenvolvia, sua linda voz tecia a trilha sonora da matéria. ♪♫ ”... Só quero lhe falar de quando a gente andava nas estrelas..."♪♫. Sua voz ficou molhada no fluir das notas. ♪♫ “... Quando a chuva passar, quando o tempo abrir, abre a janela e veja, eu sou o Sol..."♪♫.  Certamente, até o Louro José se emocionou. ♪♫ “... Eu sou céu e mar, sou seu e fim. E o meu amor é imensidão..."♪♫. A sofrida voz se calou. A matéria terminou. Ana Maria, emocionada, expunha seus pesares e comoções. Quanta melancolia no ar. Não demorou muito e logo os assuntos passaram a ser outros. A lágrima da apresentadora já havia secado. Se pesares resolvessem...! Finalizara-se o programa. Entretanto, as crianças permaneceram povoando o abrigo e, o garoto negro, provavelmente, não terá um holofote, um microfone e uma família.

Bjus, Pétalas.
:D




domingo, 10 de abril de 2011

O Homem do Lixo



Era fim de noite. Cansada, estava, das desventuras do dia. Lamuriava-me por ter lidado, a tarde inteira,  com situações sofredoras e difíceis de resolver. Como viver era complicado, pensava eu. Seria possível meu tormento tornar-se pior do que se apresentava? Certamente, concluí que, minha situação não tinha como piorar! Estendida na cama, sem perspectivas, lamentava-me e pedia ajuda a Deus. Gastava meu resto de energia, me sentindo o mais desgraçado e azarado dos seres humanos. Após um instante enfadado de silêncio, peguei o controle remoto e liguei a televisão. Canal 36. Record News. Um repórter fazia matéria sobre pessoas que viviam nos lixões de uma grande cidade, tirando dali o seu sustento. Ele entrevistava jovens, mulheres e homens, fazia perguntas sobre como viviam, pagavam suas contas e como administravam aquela situação degradante de retirar dos remanescentes urbanos a sua sobrevivência. Enquanto isso, o que me chamou a atenção e me cutucou a alma, foi um homem velho, encurvado. Usava um desbotado boné verde, possuía expressão e voz exaustas. Com movimentos fatigados, pescava itens dos detritos e jogava-os em seu saco. Meus olhos se encheram de lágrimas e uma vergonha constrangedora tomou conta de mim. Em conversa com o repórter, o homem, em voz chorosa, em tom de revolta, verbalizava, da sua forma, os seus pesares: “Tenho 65 anos de idade. Tem quatro meses que cortaram meu ordenado... daqui eu tiro comida para mim, meus dois netos e minha coroa. Se não vier pro lixo, a gente morre de fome!”. Bastou! Chorei de vergonha! Como pude ser tão egoísta, pensando ser minha situação a pior do mundo! Como pude perder de vista as perspectivas, sendo que, um idoso encontrava num monte de lixo a alternativa para sustentar sua família! Não. Definitivamente, a minha circunstância não era a pior. Eu estava em minha casa, acabara de comer algo que não foi retirado de um lixão. Estava tranqüila quanto à satisfação de algumas necessidades básicas. Sim, eu tinha motivos para estar menos desesperada.  Desfoquei a contemplação de mim mesma. Fechei os olhos e mudei a petição: Oh, Deus, socorre, Senhor, o homem do lixo.

Beijos, pétalas!
Patricia Andrade


sexta-feira, 8 de abril de 2011

Posso Ser Eu Mesma, em Várias Versões!

A fragilidade nos contorna em nuances de autenticidade. Desta bela essência nasce nossa força, que nos faz firmes, enquanto sensíveis! Este é nosso paradoxo!
                                                         !SOMOS PÉTALAS!
!BEIJINHOS, PÉTALAS!

                                                                      

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A Disputa dos Decibéis


O Som rolava solto! A multidão fervilhava diante da variedade de músicas que ecoavam dos carros ali parados e de dentro do estabelecimento. Eram 22h de uma sexta-feira, e eu estava no ponto de ônibus, defronte ao bar em questão, apelidado “Inferninho”. No tédio da espera pelo transporte, dei as costas à rua e me dediquei à observação daquele exótico cenário. Concedi liberdade aos olhos e ouvidos... Aquelas pessoas não faziam esforços para dançar um pouco de cada música. Perguntei-me se se sentiam bem naquele ambiente tão confuso à minha audição. O sorriso em seus rostos me respondia. Não somente o riso, mas o rebolado, o movimento dos corpos, o gesto despreocupado de beber sua cerveja. Enquanto eu as observava, esforçava-me para discernir uma música da outra, visto que eram ouvidas ao mesmo tempo, numa competição absurda para mostrar quem tocava mais alto, dominando o remexer dos ouvintes.  Um som sobressaíra. ♪♫“... Quando penso em você, meus olhos enchem de saudade...”♪♫. Os casais se abraçavam, trocavam carícias e se envolviam no embalo do ritmo romântico. Logo veio o concorrente. ♪♫ “... Tá dominado, tá tudo dominado...” ♪♫. O frenesí possuiu aqueles indivíduos, fazendo-os se mover em desordem. A competição continuou. Tão logo os volumes das músicas iam se alternando, as pessoas, em gestos totalmente despreocupados, trocavam de gingados facilmente, com uma animação de quem realmente estava se divertindo. ♪♫ “... Chora, me liga, implora meu beijo de novo, me pede socorro, quem sabe eu vou te salvar...” ♪♫. A moça arrochava na coxa do rapaz. Duas meninas e um homem grudaram-se, formando um “sanduíche humano”. ♪♫ “... Quer dançar, quer dançar, o tigrão vai te ensinar...” ♪♫. Como poderia tamanho barulho divertir aquela gente! A disputa continuava. ♪♫ “... Thuco, thuco, thuco do povo...” ♪♫. O “inferninho” pipocava em fervores alucinados. A música eletrônica sacudia os corpos na pista de dança. Só de olhar e ouvir, minha mente já estava cansada e meus ouvidos abafados por tanto estrondo. Convenci-me de que, realmente, não era aquela a minha alternativa de descontração. Cansada da posição de espectadora do ambiente em chamas, voltei corpo e olhos à rua, decidida, então, a pensar somente no veículo que estava por vir. Que bom que iria me divertir também, mas em casa, do meu jeito. Um farol clareou lá na frente. Era o bendito ônibus!


Patrícia Andrade
Bjus, pétalas!