terça-feira, 15 de novembro de 2011

Pensando bem...

...Eu não quero desacreditar no 'pra sempre'.  Só porque ele foi perdido por outros, não preciso, necessariamente, dá-lo por perdido para mim. Eu quero um amor inventado todos os dias, mas que a matéria-prima seja o mesmo amor. Quero a mudança de atitude quando for imprescindível ao relacionamento, sem questionamentos egoístas. Quero um amor que não sente vergonha de pegar na minha mão, de me abraçar, e que faça muita, mas muita questão de conhecer cada limite e detalhe de meu corpo. Quero o amor que deseja tirar fotografias na pizzaria, na pracinha, onde quer que estejamos... Que cada momento nosso seja motivo para ser registrado e divulgado. Preciso da companhia com ausência de fantasmas do passado, sem precedentes e exigências frutos de traumas. Dedos dispostos a tocar os meus cabelos, corpo dependente da proximidade, preocupação não egocentrista em suprir minhas necessidades de prazer. É disso que preciso, e acrescento, com um estalo de desejo, o uso da aliança. De coco, de prata, não importa. O símbolo do compromisso faz bonito o significado. Quero você chegando hoje de mansinho e dizendo  ao meu ouvido que seus limites foram vencidos e que está de forma completamente aberta para me amar do jeito de que mais necessito. Quero o amor que me ame, que construa comigo um relacionamento duradouro, e que mesmo este não sendo eterno, seja semeado na intenção de alcançar o ‘pra sempre’. Quero ter ao meu lado os olhos que, mesmo em face de maior encanto, de mim se encantem mais. Preciso de mudanças, de crescimentos, de um amor maduro. E se imaturo for, que esteja de mãos prontas para crescer derrubando as barreiras que impedem a nossa felicidade. Que persigamos o ‘pra sempre’ na certeza de que nosso amor é o maior do mundo e o mais bonito. Não perfeito, mas que saiba amar acima das diferenças... Ouvi que a força e intensidade do desejo trazem os acontecimentos bons. Já sabendo disso e... pensando bem... seria doce se eles viessem juntos com você.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O Dia de José

Todos nós temos o dia do encurralamento, da pressão sutil, do silêncio ensurdecedor. Quando a voz de nossa própria mente nos pergunta para onde vamos, para onde estamos indo e de que forma. Seria o caminho da vez o mais sensato? As sensações oportunas? “E agora, José?” Quando a festa acaba e a luz apaga, como sumir junto com o povo? O que fazer com o nome que em nada apaga do anonimato o grito que vem de dentro? As negações de desejos e necessidades dolorosamente retomadas à consciência levam-nos a um beco sem saída. “E agora, José?” A noite esfria e o dia não vem, muito menos o bonde. Os monólogos interiores, as músicas, o cansaço e a morte em nada resolvem a falta de fôlego. O José de Drummond marcha sozinho no escuro. Sem saber para onde, ele marcha. Caminhamos, cansamos, descobrimos uma linha de mínimo equilíbrio e ali nos fixamos. Quando a corda trepida é hora de dar outro passo em busca de novos portos seguros. Assim a caminhada não cessa, as necessidades se satisfazem sob esforços. A vida severina pós-moderna deixa de ser aquela em que se morre de velhice antes dos trinta e passa a ser a que nos obriga a desfazer a tocaia de todos os dias. Mesmo assim, marcha nosso José.  “José, para onde?”

domingo, 21 de agosto de 2011

O Motorista do Ônibus



Mais uma noite de aula na universidade. São 22h e já estou no ônibus indo para casa. Como sempre, o veículo está lotado. Desisto de passar agora pela catraca e me acomodo em pé, próximo à porta. Atrás de mim encontram-se dois rapazes conversando aos gritos. Penso que seja por conta do barulho do motor do carro. Não importa tanto. Tento analisar o teor do diálogo, mas logo desisto. Pior do que a bateria do mp4 estar descarregada é ter que passar trinta minutos em pé num ônibus ouvindo papo vazio de homem jovem. Concentro-me na visão à minha frente, a estrada. Percebo que todos neste veículo conversam, gesticulam, emitem sons. Exceto eu e outra pessoa, talvez a menos perceptível para os demais, o motorista. Provavelmente se eu perguntar ao estudante que está lá no fundo qual a cor da pele do condutor ele não saiba responder. Com os olhos no volante, concentro-me nesta alma cinza, mas cheia de cores para mim. Ele me chama a atenção ali concentrado nas marchas, nas curvas, nos faróis, calado, mergulhado em si mesmo. Uma pessoa muda, em introspecção, sempre me cutuca os sentidos. Isso porque o silêncio fala alto comigo. Tenho meia hora de estrada pela frente e logo me ocupo de esboçar-lhe o perfil. Aproximadamente 58 anos, pele negra, calvo, rugas por todo o rosto, camisa surrada, coluna encurvada e expressão de extremo cansaço. Por quantas horas este senhor já deve ter dirigido hoje? As interrogações começam a brotar em minha mente. Teria ele uma família? Um homem nesta idade necessita de ter pessoas a lhe esperar em casa. Como terá sido o seu dia? Como deve se sentir ao transportar, diariamente, dezenas de pessoas desconhecidas, que entram no ônibus sem nem demonstrar que percebem sua existência? Ainda não enxergo com naturalidade certas práticas capitalistas que encerram o ser humano numa esfera de máquinas programadas e desprovidas de sentimentos. Concluo que se este homem possui baixa auto-estima, este emprego o afunda mais no poço da dor de existir. Como gostaria de trocar algumas palavras com ele, monossilábicas que fossem, mas apenas para que ele veja que eu o enxergo, que o percebo, que ele existe sim. Mergulho na análise de cada movimento de seus olhos, mãos, pés e respiração. Alguém lá no fundo pede o ponto para descer. Olho para fora da janela e percebo que o mergulhar no espírito do motorista levou todo o tempo do percurso. Ele freia o ônibus. É chegada a minha hora de sair. Antes de passar pela catraca olho para ele e emito alguns sons com firmeza na voz e entusiasmo: – Boa noite, Senhor Motorista. Bom trabalho e ótimo descanso. Ele me encara, bastante surpreso e move os músculos emperrados do rosto, desenhando um lindo e largo sorriso para mim. Desço do ônibus feliz e o vejo partir. Sinto-me aliviada, pois mesmo que por segundos, consegui fazê-lo existir novamente.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

O Filme de Suzana

A mulher traída entrou em casa, furiosa, decidida a por em prática seus esquemas de vingança, minunciosamente premeditados. O adúltero estava lá, como de costume, jogado no sofá. A entrada da esposa não foi percebida, o que favoreceu suas ações. Ela foi à cozinha, sacou a faca e, aproximando-se da poltrona onde ele estava, por trás, a enfiou em seu pescoço. A agonia iniciara-se. Ela deu a volta e sentou-se em seu colo para vê-lo agonizar de perto, enquanto o sangue jorrava em jatos frenéticos. Antes que o sofrimento terminasse, teve a ideia de arrancar-lhe os olhos com as próprias mãos. O fez com tamanha satisfação, que suas gargalhadas se tornavam mais vibrantes tão logo seus dedos penetravam mais fundo o crânio do cônjuge. Com os globos oculares em mãos, tratou de fazer o esposo sentir o último sabor de sua vida. Meteu-lhes na garganta dele e pôs-se a observar a sua performance em últimos suspiros. Esvaziou-se de sangue, engasgou-se com suas próprias retinas, e finalmente morreu. A esposa lesada sentiu-se plenamente justiçada. Levantou, lavou as mãos, conferiu o passaporte na mala e saiu porta afora, desaparecendo sem deixar rastros maiores. As luzes do cinema se acenderam. Suzana se levantou, deixou o lugar e fez o trajeto de volta para casa, pensando nestas últimas cenas do filme que acabara de ver. Quanto sangue...Graças a Deus não há traição em meu casamento, pensou ela, enquanto entrava em sua moradia. Em segundos, percebeu os gemidos de Leonardo, o marido. E misturados a estes, ouvia suspiros de uma mulher. Por um breve momento sentiu-se sem saber o que fazer. Foi somente questão de instantes mesmo. Antes de entrar no quarto para fazer o flagrante, Suzana visitou a cozinha. A faca foi suprimida da gaveta. O filme entrou em reprise.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Velha Infância

...Porque não há nada mais confortante do que ler as melhores partes da velha infância, vividas com a melhor das companheiras...

"Gritavam e corriam ensandecidamente ... o monstro do escuro as perseguia até que elas alcançavam a casa... descobriram um dia que tudo não passava de ilusão.   


Saudade de andar devagarzinho em fila, balançar o portão do Rotary e correr doida achando que o monstro do escuro estava vindo. (rs) Bons  tempos aqueles. Perder o medo do inexistente e labutar com as dores reais é o preço de crescer! 

Cada pedacinho bom de minha infância tem você, prima amada. Te amooooooo há 26 anos. "

     By Leila Andrade (prima-amiga-irmã).






P.S.: Eu te amo, Dedinha!

terça-feira, 19 de julho de 2011

Aos 26 anos

Aos vinte e tantos anos aprendi, a duras penas, que os suspiros de costume são já inconvenientes. Enxerguei que ainda nem são 30 anos, porém a crise da meia idade pode ser sentida se a introspecção for mais afinada. Percebi que o ser humano é tendencioso, que  somente os cães são capazes de exercer a verdadeira fidelidade. Lamentável, pois disso deduz-se que se pode confiar, estritamente, numa figura chamada Ninguém. Os amigos revelam-se amigos de si mesmos e os colegas de rotina confundem-se na definição de amizade. Somente aos vinte e alguns anos enxerguei que não se tem outra chance  para causar uma segunda primeira impressão e que não adianta disfarçar o sofrimento com foscas saudações de bom dia. A angústia do outro  o prende em seu próprio mundo e o torna cego. O interesse move as relações. Estas são fruto de uma mera necessidade instintiva, ou reduzem-se a consequências de más escolhas. Eis a maioria dos casamentos. Com vinte e uns anos senti que não posso mais sonhar como quando dez eu tinha. Ouvi que a vida terrena é passageira e que preciso preencher meu tempo com o que dá sentido a vida, ou seja, com o que dá dinheiro. Flagrei-me questionando-me se há felicidade nessa vida tão corrida. Desisti da resposta quando comecei a sentir que os felizes são, na verdade, os mais oprimidos. Vi que não se morre de amor, não se trabalha para viver. Faz-se o contrário. Aprendi que quanto mais se convive com uma pessoa, menos se a conhece. Parentes são estranhos nascidos no mesmo bairro e o direito de escolha é a maior ilusão já inventada. Aos vinte e seis anos recebi na minha caixa de correspondência duas verdades: a revolta contra a coerção é suicídio e as intenções humanas são sempre as piores possíveis. E eu paro por aqui.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Um Lugar Dentro Dela

O ambiente refrigerado não a convencia a estar no meio dos outros colegas. Na aula de Literatura, ela se concentrava nas palavras da professora. Entre uma e outra piada da mestra e gargalhadas dos alunos, eu a observava com maior atenção, a fim de sacar-lhe o esboço de um sorriso. Entretanto, foram apenas dois, desenhados aos cantos da boca. O que faria uma garota, numa sala com cem cadeiras vazias, sentar-se numa das últimas, totalmente isolada dos demais? Talvez para não permitir que alguém interrompesse sua concentração... Quem sabe possuiria uma personalidade anti-social e em avançada introspecção... Cabelos amarrados, olhos cansados e com olheiras, pernas e braços fortemente cruzados e uma seriedade chamativa. Todos estes traços alardeavam seu alheamento a qualquer mundo que não fosse o seu, e a rejeição a todo tipo de contato ou aproximação. Certamente ali dentro era mais agradável que fora. A despreocupação com o que acontecia na realidade exterior a si mesma era fascinante. Somente ela me poderia esclarecer os verdadeiros motivos que a faziam estar dentro da concha. Sem dúvida, evidente era que eu jamais a interrogaria. Longe de mim estava a intenção de tumultuar a paz daquele lugar dentro dela. Restavam-me os seus traços subentendidos e o doce enigma da observação.  E, lógico, não seria eu o quebrar do silêncio daquele espaço fechado, totalmente cerrado lá dentro. A aula chegara ao fim. Rumo à porta, todos.

domingo, 5 de junho de 2011

Fora da Bolha

Bar na pracinha, sonzinho romântico ao vivo. Pessoas e casais a beber e a sorrir com liberdade povoavam as mesas ali dispostas. Amigas e eu conversávamos e o clima era de total descontração, não havendo espaço para tristeza ou desânimo. Numa pausa da discussão, ao lançar o teceiro olhar para o ambiente, já mais atento, percebi que existia uma criatura com o espírito cinza, destoando aquele clima perfeccionista. Ficava pouco distante da última mesa, contemplando a multidão que se rasgava em risos ébrios, o adolescente maltrapilho e desgostoso com sua condição frente aos que se divertiam, indiferentes ao seu redor, cada um dentro de sua bolha. Os olhos daquele jovem sofrido mostravam uma reflexão dolorosa, senão inútil. Talvez racionalizava a idéia de que todos ali, quando cansassem da descontração, iriam para suas casas, suas camas, para o conforto quentinho de suas noites. Talvez olhariam para ele, lhe dariam um dinheiro para comer, oferecer-lhe-iam um lar decente. Que nada! Seu olhar absorvia apenas desilusão, descrença, e, possivelmente,  uma revolta sem chances de romper a escuridão que determinava sua vida. Após muito tempo de observação, abaixou a cabeça num gesto de total impotência e arrancou seu corpo daquele lugar, em passos mortos, convícto de que ninguém ali teria motivos para sair de seu comodismo e enxergar a sua necessidade. Levou as mãos aos olhos como quem enxuga uma lágrima e voltou para seu leito, o papelão numa calçada suja. Ele, naquele momento, talvez desejasse estar também dentro de uma bolha, mesmo que fosse somente para se isolar daquela madrugada gélida. Restou a mim, unicamente, retornar ao mundo das minhas amigas.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

O Garoto Negro Que Queria Ser Cantor


A televisão e Ana Maria Braga me acordaram. No Mais Você, a loira apresentava uma reportagem sobre algumas crianças de um abrigo, onde eram acolhidas quando retiradas das ruas e do seio de famílias desestruturadas. Uma a uma, aquelas desafortunadas criaturas iam dando seu depoimento acerca da carência afetiva e de seus sonhos em família. Como nossas crianças são maltratadas! Passa de 4 mil a quantidade delas, prontas para a adoção. Porém, as famílias a isso dispostas discriminam suas exigências: A criança precisa ser, impreterivelmente, de até 3 anos, do sexo feminino e branca. O menino, adolescente, negro, que queria uma família, explicava seu desejo de ter pai e mãe que lhe ajudassem a ser cantor. Enquanto a conversa com o repórter se desenvolvia, sua linda voz tecia a trilha sonora da matéria. ♪♫ ”... Só quero lhe falar de quando a gente andava nas estrelas..."♪♫. Sua voz ficou molhada no fluir das notas. ♪♫ “... Quando a chuva passar, quando o tempo abrir, abre a janela e veja, eu sou o Sol..."♪♫.  Certamente, até o Louro José se emocionou. ♪♫ “... Eu sou céu e mar, sou seu e fim. E o meu amor é imensidão..."♪♫. A sofrida voz se calou. A matéria terminou. Ana Maria, emocionada, expunha seus pesares e comoções. Quanta melancolia no ar. Não demorou muito e logo os assuntos passaram a ser outros. A lágrima da apresentadora já havia secado. Se pesares resolvessem...! Finalizara-se o programa. Entretanto, as crianças permaneceram povoando o abrigo e, o garoto negro, provavelmente, não terá um holofote, um microfone e uma família.

Bjus, Pétalas.
:D




domingo, 10 de abril de 2011

O Homem do Lixo



Era fim de noite. Cansada, estava, das desventuras do dia. Lamuriava-me por ter lidado, a tarde inteira,  com situações sofredoras e difíceis de resolver. Como viver era complicado, pensava eu. Seria possível meu tormento tornar-se pior do que se apresentava? Certamente, concluí que, minha situação não tinha como piorar! Estendida na cama, sem perspectivas, lamentava-me e pedia ajuda a Deus. Gastava meu resto de energia, me sentindo o mais desgraçado e azarado dos seres humanos. Após um instante enfadado de silêncio, peguei o controle remoto e liguei a televisão. Canal 36. Record News. Um repórter fazia matéria sobre pessoas que viviam nos lixões de uma grande cidade, tirando dali o seu sustento. Ele entrevistava jovens, mulheres e homens, fazia perguntas sobre como viviam, pagavam suas contas e como administravam aquela situação degradante de retirar dos remanescentes urbanos a sua sobrevivência. Enquanto isso, o que me chamou a atenção e me cutucou a alma, foi um homem velho, encurvado. Usava um desbotado boné verde, possuía expressão e voz exaustas. Com movimentos fatigados, pescava itens dos detritos e jogava-os em seu saco. Meus olhos se encheram de lágrimas e uma vergonha constrangedora tomou conta de mim. Em conversa com o repórter, o homem, em voz chorosa, em tom de revolta, verbalizava, da sua forma, os seus pesares: “Tenho 65 anos de idade. Tem quatro meses que cortaram meu ordenado... daqui eu tiro comida para mim, meus dois netos e minha coroa. Se não vier pro lixo, a gente morre de fome!”. Bastou! Chorei de vergonha! Como pude ser tão egoísta, pensando ser minha situação a pior do mundo! Como pude perder de vista as perspectivas, sendo que, um idoso encontrava num monte de lixo a alternativa para sustentar sua família! Não. Definitivamente, a minha circunstância não era a pior. Eu estava em minha casa, acabara de comer algo que não foi retirado de um lixão. Estava tranqüila quanto à satisfação de algumas necessidades básicas. Sim, eu tinha motivos para estar menos desesperada.  Desfoquei a contemplação de mim mesma. Fechei os olhos e mudei a petição: Oh, Deus, socorre, Senhor, o homem do lixo.

Beijos, pétalas!
Patricia Andrade


sexta-feira, 8 de abril de 2011

Posso Ser Eu Mesma, em Várias Versões!

A fragilidade nos contorna em nuances de autenticidade. Desta bela essência nasce nossa força, que nos faz firmes, enquanto sensíveis! Este é nosso paradoxo!
                                                         !SOMOS PÉTALAS!
!BEIJINHOS, PÉTALAS!

                                                                      

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A Disputa dos Decibéis


O Som rolava solto! A multidão fervilhava diante da variedade de músicas que ecoavam dos carros ali parados e de dentro do estabelecimento. Eram 22h de uma sexta-feira, e eu estava no ponto de ônibus, defronte ao bar em questão, apelidado “Inferninho”. No tédio da espera pelo transporte, dei as costas à rua e me dediquei à observação daquele exótico cenário. Concedi liberdade aos olhos e ouvidos... Aquelas pessoas não faziam esforços para dançar um pouco de cada música. Perguntei-me se se sentiam bem naquele ambiente tão confuso à minha audição. O sorriso em seus rostos me respondia. Não somente o riso, mas o rebolado, o movimento dos corpos, o gesto despreocupado de beber sua cerveja. Enquanto eu as observava, esforçava-me para discernir uma música da outra, visto que eram ouvidas ao mesmo tempo, numa competição absurda para mostrar quem tocava mais alto, dominando o remexer dos ouvintes.  Um som sobressaíra. ♪♫“... Quando penso em você, meus olhos enchem de saudade...”♪♫. Os casais se abraçavam, trocavam carícias e se envolviam no embalo do ritmo romântico. Logo veio o concorrente. ♪♫ “... Tá dominado, tá tudo dominado...” ♪♫. O frenesí possuiu aqueles indivíduos, fazendo-os se mover em desordem. A competição continuou. Tão logo os volumes das músicas iam se alternando, as pessoas, em gestos totalmente despreocupados, trocavam de gingados facilmente, com uma animação de quem realmente estava se divertindo. ♪♫ “... Chora, me liga, implora meu beijo de novo, me pede socorro, quem sabe eu vou te salvar...” ♪♫. A moça arrochava na coxa do rapaz. Duas meninas e um homem grudaram-se, formando um “sanduíche humano”. ♪♫ “... Quer dançar, quer dançar, o tigrão vai te ensinar...” ♪♫. Como poderia tamanho barulho divertir aquela gente! A disputa continuava. ♪♫ “... Thuco, thuco, thuco do povo...” ♪♫. O “inferninho” pipocava em fervores alucinados. A música eletrônica sacudia os corpos na pista de dança. Só de olhar e ouvir, minha mente já estava cansada e meus ouvidos abafados por tanto estrondo. Convenci-me de que, realmente, não era aquela a minha alternativa de descontração. Cansada da posição de espectadora do ambiente em chamas, voltei corpo e olhos à rua, decidida, então, a pensar somente no veículo que estava por vir. Que bom que iria me divertir também, mas em casa, do meu jeito. Um farol clareou lá na frente. Era o bendito ônibus!


Patrícia Andrade
Bjus, pétalas!

quinta-feira, 31 de março de 2011

A Missão


Porque os compromissos da vida secular impõem aos indivíduos certas obrigações, eu me encontrava sentada à mesa da cozinha, lendo um livro de Sociologia, totalmente alheia ao cenário externo a mim. Um som ecoou da varanda,  desconcentrando-me na leitura. Direcionei o olhar para lá e pude me alegrar com a eminente visita de um sabiá do peito amarelo, que gorjeava insistentemente como se estivesse a chamar por alguém. Fixei a atenção nele, me desliguei do livro e investi tempo na observação daquele pequeno ser. A meu ver, seu cantarolar, suave para mim e substancial para ele, não comunicava outra coisa, senão o manifestar da existência. Ele estava ali, ora pensativo, ora movente, me olhando e mostrando a mim e à natureza que ele era real, que sua presença no mundo era digna de reconhecimento. Tão digna, que o notar de sua vida foi involuntário da minha parte. Seu agudo timbre penetrou meus ouvidos, como a campainha de uma casa a avisar que alguém espera à porta para ser atendido. Cumpri minha obrigação de ver quem era. Recebi, com espírito aberto, minha visita. Ouvi-lhe, aceitei sua mensagem de paz e retribuí com um sincero sorriso de agradecimento e satisfação. Com a missão cumprida, ele se posicionou e voou a caminho de outro objetivo. Deparei-me com o desejo de que sua próxima visita fosse a uma alma amargurada, necessitada de um motivo para sorrir. Como gostaria que ele voltasse no dia seguinte... Até lá, esperava já ter terminado a leitura do meu livro.


Bjus, pétalas!
Patrícia Andrade

quinta-feira, 24 de março de 2011

O Exame

Havia saído de uma consulta médica e, na volta para casa, entrei num laboratório a fim de saber quanto me custariam alguns exames de sangue. Peguei a senha de atendimento e sentei-me na única cadeira disponível na sala de espera. Quanta gente, de várias cores e expressões.
 Fixei meus olhos na recepcionista, que chamava cada um pelo seu número: Senha 22! Senha 23! Eu estava angustiada com a espera.
Num de meus movimentos frenéticos de impaciência, percebi que ao meu lado esquerdo havia um rapaz que balançava a perna insistentemente. Fiquei me perguntando o que ele estaria sentindo naquela hora. Assim que comecei a refletir sobre seu comportamento aflito, pude ouvir a recepcionista chamá-lo a uma sala à parte, alegando que a médica desejava falar-lhe antes de liberar o resultado de seus exames.
 Acompanhei, copiosamente, o seu deslocamento aos fundos da clínica e, depois de alguns minutos, ele voltou a sentar-se ao meu lado, agora com um comportamento bem mais aflito e angustiante. Assim que começou a chorar - sucumbindo emocionalmente enquanto processava a provável informação que recebera da médica ao telefone -, fui tomada por uma sensação de impotência e curiosidade de saber qual doença ele descobrira ter. Como gostaria de poder tocar-lhe as mãos e dizer que tudo ficaria bem... O seu desespero aumentava...
 A recepcionista, enfim, entregou-lhe o envelope com os exames. Foi com lágrimas de pavor nos olhos e mãos trêmulas que ele recebeu, guardou-o na mochila e dirigiu-se lentamente até a porta. Pôs a mão na maçaneta, mas parecia não ter forças para movê-la. Respirou fundo, enxugou os olhos, reuniu forças e saiu  no compasso de um relógio cansado de contar o tempo.
Fiquei me perguntando o que acontecia com ele... Teria descoberto que estava infectado pelo vírus HIV? Alguma doença grave? Sua existência e sua juventude estariam ameaçadas? Não sei. Provavelmente, jamais saberia. Talvez, em alguns dias, eu viesse a esquecer este momento. A única certeza que eu tinha era de que, para ele,  sim, aquele instante seria inesquecível: o dia da notícia não desejada, o dia da dor.
Meus olhos permaneceram inertes, voltados para a  porta... Senha 24! Era a minha vez.




Patrícia Andrade




quarta-feira, 23 de março de 2011

'Pétala'

Nada brilha mais do que o seu amor, sua luz alimenta meu fôlego e me faz bem aventurada. 
Ele me dá um caminho a seguir e eu o faço convicta. Como é suave o seu lindo amor, como é delicado e calmo!
Oh, meu bem, eu vivo o prazer de desejar teus beijos todos os dias e é esse anseio que me faz sentir o gosto da vida...
Ele é absoluto....mas transborda em si...
Ele é devaneio...mas se mostra a mim...
Ele é o amor...apodera-se, Enfim!                                      

Agora, parafraseando em Djavan:

"Pétala"

O seu amor
Reluz
Que nem riqueza
Asa do meu destino
Clareza do tino
Pétala
De estrela caindo
Bem devagar...
Oh! meu amor!
Viver
É todo sacrifício
Feito em seu nome
Quanto mais desejo
Um beijo, um beijo seu
Muito mais eu vejo
Gosto em viver
Viver!
Por ser exato
O amor não cabe em si
Por ser encantado
O amor revela-se
Por ser amor
Invade
E fim!



Bjus, pétala!
Patrícia Andrade

No Ônibus


Toda vez que estou no ônibus, indo ou voltando da faculdade, o silêncio paira. As pessoas se calam, mas, interiormente, as vozes não cessam! Como eu queria ter o poder de escutar mente por mente... É certo que descobriria um assassino, uma suicida em potencial, o sonho de uma criança, um segredo horrendo, entenderia melhor as emoções alheias...E, no fim das contas, poderia até me divertir com as loucuras e devaneios do povo que vive ao meu redor,  mas que nem sempre é gente sã como sua capa aparenta. 
O anseio de enxergar os bastidores do ser humano, o que há por trás de suas máscaras, me faz sentir uma adrenalina terrível! 
Mesmo sendo legal e divertido ler as mentes dos outros, seria complicado também, pois, certamente, eu não seria amiga de alguns. 
Eita, miséria, a mania humana de fingir  e se esconder atrás do que lhe é conveniente!
Enquanto eu não alcanço esse super poder, desfruto do conforto e privacidade de meus pensamentos!

Bjus, pétalas!

Patrícia Andrade